Certos eventos estão tão banalizados pela mídia que eu estou começando a assimiliar as notícias não pelo fatos narrados pela imprensa, mas pela forma, cuidado e desdobramento que os mesmos fatos geram após sua divulgação inicial.
Vou dar um exemplo: o recente caso do Promotor de Justiça (esse termo na minha opinião, se refere a alguém que promove a justiça e, para tanto, deve “rigorosamente” seguir a lei, antes de mais nada) que deu 10 tiros de uma arma exclusiva das forças armadas num motoboy que, desarmado e desacompanhado (um fato inédito nos assaltos por assaltantes motorizados), tinha assaltado pelo menos mais 5 vítimas na última meia hora de sua infeliz vida. Detalhe importante: segundo as testemunhas, ele apesar do capacete, estava com a viseira levantada e podia-se ver “perfeitamente” seu rosto, não havendo dúvidas sobre os reconhecimentos.
Não vou entrar no mérito da questão de se o promotor falou a verdade e era mesmo um assalto desarmado (modalidade conhecida entre os assaltantes como “na moral”) ou se tudo isso não passa de mais um teatro jurídico que tem se tornado tão comum quando algum figurão é pego em uma atitude “extremada” (para dizer o mínimo, depois de 10 tiros de 9 milímetros).
Vou sim chamar a atenção para o cuidado que a imprensa está tendo em sempre se referir ao Promotor de Justiça como “Senhor Promotor de Justiça” e ao supeito assaltante com “motoboy”. Por um lado é louvável o cuidado em continuar se referindo ao motoboy pela sua profissão comprovada e não como “acusado”, ou como “provável assaltante”. Nisso a mídia merece meus aplausos. Mesmo que fique provado um dia que ele tenha mesmo tentado assaltar o promotor até lá a imprensa está fazendo um trabalho imparcial com as informações até onde elas foram divulgadas.
Por outro lado, o respeito pelo promotor está extrapolando o bom censo. No mínimo, ele estava com uma arma das forças armadas, o que por si só já é um crime hediondo para quem tem como meio de vida promover a justiça. E ainda existe o agravante de ele ser membro de uma comissão que investiga crime de policiais. Isso procede? Ora, até onde eu sei, um dos principais crimes dos policiais é obter de forma ilegal armas ilícitas para uso próprio ou para aliciamento de autoridades (o famoso “arrego”). Como essa arma foi parar na mão do Senhor Promotor?
Não vi em nenhum momento nenhum órgão de imprensa ou editorial execrando o fato da arma ser de uso exclusivo das forças armadas. E isso nem foi motivo suficiente para que os superiores do Senhor Promotor o afastassem de seu cargo. Isso quer dizer que para as autoridades acima dele, que promovem a justiça, existe algum tipo de tolerância para esse crime.
Espero que haja Justiça nesse caso. Por enquanto, a única verdade comprovada é que um motoboy foi enterrado sob a suspeita de ser um ladrão e um promotor de justiça vai viver sob a suspeita de fazer a justiça com as próprias mãos: a bala e com arma ilegal…
Comments
Sr. Paulo Addair
Suas ponderações procedem. O único porém, em seu texto, é o de se referir ao emprego da arma exclusiva como um crime “hediondo”. Compreendo que o termo foi utilizado em seu sentido comum, vernáculo, de “abominável”, ou “digno de ódio”, porém o termo, quando composto como “Crime Hediondo” deve ser referido apenas aos crimes tipificados como tal pela Lei dos Crimes Hediondos (8.072/90) e sua última modificação, introduzida pela Lei 11.464/07…
Paulo, meu ótimo amigo, eu continuo o micuim de sempre… E, mais que sempre, o admiro e respeito. Minhas melhores saudações! Sylvio José
Tenho ciência disso, meu amigo. E usei o termo por que considero que esse tipo de crime (usar arma de uso exclusivo das forças armadas) deve ser incluido na tipificação de crime hediondo, pois não tenho a menor tolerância com alguém que usa esse tipo de arma. Essa atitude pressupõe dolo, além de denotar o desreipeito pela lei, o que é agravado pelo cargo que o “portador” ocupa.
Muito obrigado pela oportunidade de esclarecer minha posição.