Comemorei o nosso Dia da Independência terminando de ler uma “trilogia literária” instigante: As Veias Abertas da América Latina, de Eduardo Galeano, e os dois “volumes” do “Discurso sobre o Idiota” de Mendoza, Montaner e Llosa.
A primeira é uma obra considerada por muitos a “Biblia do Socialista Latino Americano”. E deve ser mesmo, pois até Chaves a deu de presente para Obama. As duas outras são uma espécie de “Réplica Capitalista” ou, melhor dizendo, “Republicana” às idéias de Galeano.
Galeano eu já tinha lido na década de 70, sob os olhares reprobatórios e desconfiados de meus amigos e colegas de Escola Técnica Federal. Acho que quase fui preso, talvez. Mas esse não foi o mais execrável livro que li naquela época: também andei lendo “O Futuro da Revolução socialista Soviética”. Com esse último, sim, pude separar os verdadeiros amigos dos colegas de ocasião. Foi uma debandada geral.
Depois lí o “Manual do Perfeito Idiota Latino-americano”, primeiro livro do trio elitista, agressivo e pretensamente cômico Mendoza, Montaner e Llosa. Esse eu li mais de vinte anos depois, já à época da discussão do neoliberalismo econômico, modelo que recentemente se mostrou tão burro quanto o próprio socialismo.
Agora, nesta semana, terminei de ler o terceiro livro “A volta do idiota”. Não antes de reler Galeano, só para reavivar as referências.
Neste ponto quero deixar claro que não sou nem um pouco socialista. O que não quer dizer que seja um capitalista radical. Esse maniqueísmo econômico, que pende entre as leis de mercado de Adam Smith (século XVIII) e a doutrina comunista de Karl Marx (século XIX) é talvez o responsável por boa parte das mazelas da humanidade desde a revolução industrial. E isso inclui até os conflitos religiosos, já que esses se reavivaram no loteamento pós-primeira guerra mundial do Império Otomano entre os vencedores, para garantir ao Ocidente o acesso fácil ao petróleo Árabe. Tudo questão econômica.
Nesse ponto, Galeano é mais fundamentado em suas informações sobre a exploração das colônias latino-americanas pelos impérios que se sucederam em 500 anos. Fornece várias referências econômicas e históricas. Mas foi muito superficial nas conclusões sobre as reais causas dessa exploração. E quando falava sobre qualquer iniciativa que vislumbrasse um perfil socialista, era totalmente passional. Principalmente na página onde fala sobre suas esperanças a respeito de Cuba. E foi passional como todo fanático religioso o é, apesar de o socialismo ser, por princípio, ateu. E não há crente mais fanático que um socialista convicto.
Por outro lado, Mendonza et all são, como todo elitista, pedantes, sarcásticos e igualmente radicais em suas colocações sobre o que eles definiam, pejorativamente, como o Perfeito Idiota Latino-americano. Têm excelentes argumentos para descontruir vários mitos que levaram a América Latina a uma sequencia infindável de caudilhos, mas também interpretam de maneira míope as causas de nosso subdesenvolvimento. Eles acreditam que é um complexo de inferioridade congênito, crença que por si só já parece oriunda do próprio complexo que propõe. Debocham, ridicularizam e, assim como Galeano, polarizam o debate entre duas “castas” (apenas para usar um termo “na moda”). Enquanto Galeano divide o discurso entre “exploradores” e “explorados”, Mendonza et all os divide entre “Idiotas” e “Esclarecidos” (esse termo é meu, por falta de outros nos livros).
De qualquer forma, foi um excelente exercício que me permitiu chegar ao nosso dia da independância com uma consciência clara de como o nosso país chegou até aqui, o porque do grande sucesso popular de Lula, o que pode acontecer com o BRIC e, principalmente, me dar ao luxo de discordar tanto de Galeano, quanto de Mendoza, Montaner e Llosa pois nem somos vítimas inocentes de exploradores imperialistas, nem tão pouco idiotas ignaros a mercê de caudilhos de ocasião.
E me permito até discordar de Friedrich Hegel, pois este não é, definitivamente “O Fim da História”.